Impossível negar a influência da tecnologia no mundo contemporâneo. Com esse foco, Martha Gabriel, especialista em marketing digital, inovação e educação, sacudiu o público presente à palestra que fechou o primeiro dia de palestras no 26º Encafé. A professora da PUC/SP abriu sua apresentação lembrando aos presentes que “a tecnologia não é neutra. Ela entra no mundo e muda tudo ao seu redor, tanto para o bem como para o mal”.
No século passado, qualquer tecnologia demorava décadas para atingir 50 milhões de pessoas. Hoje é possível alcançar um número muito maior de gente num piscar de olhos. A velocidade faz parte do momento no qual estamos inseridos: a quarta revolução industrial, marcada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas. Das máquinas a vapor do século 18 aos robôs do século 21, muita coisa cambiou. Não só no tipo de tecnologia mas também no cotidiano das pessoas e das empresas – forma de vida, de trabalho e de relacionamento.
“Se a tecnologia muda, o ser humano também muda, e isso vem desde o início da humanidade”, destacou. Nesse sentido, Martha lembra que é importante questionar-se, em meio a um ritmo acelerado de mudanças, se sabemos usar a tecnologia e também pensar em qual será seu uso.
Mentalidade digital significa ser capaz de se perguntar se existe um aplicativo que ajude a resolver o tema em questão e, principalmente, saber se o uso ou não do digital é apropriado. “Ter mentalidade digital é focar em problemas, entender o que está acontecendo e usar a melhor tecnologia para resolvê-lo, mesmo que isso signifique um caminho não digital”.
As mudanças promovidas pela tecnologia levam à alteração na forma como as pessoas vivem. Surgem novas demandas na vida e nos negócios também. Por isso é preciso estar atento e preparado para elas. Martha cita como exemplo o wi-fi. “Hoje em dia, nos hotéis, as pessoas não buscam mais uma TV grande, mas querem wi-fi. Isso é importante e isso é uma mudança”. Assim, é importante estar preparado para o que acontece e as demandas que advêm dessas mudanças, o que se traduz em uma possibilidade de agregar valor ao negócio.
Os novos conhecimentos jorram e numa velocidade cada vez maior. Em 2020, a expectativa é que a cada 12 horas o volume de conhecimento dobre. “ Vivemos, portanto, um colapso informacional. Como conseguir ver tudo? Se a gente não organiza, a gente só faz o que pode, o que dá conta. Daí a importância da ajuda da inteligência artificial”, destaca.
Martha Gabriel explica que as tecnologias de inteligência não tornam a pessoa mais inteligente, mas quem sabe utilizá-las responde melhor e entende melhor as demandas. Ela questiona como cada um está usando a tecnologia e ressalta a necessidade de haver, antes da inclusão digital, uma educação digital. “As pessoas deixam crianças de três anos sozinhas com um tablet. Isso não é educação digital, mas é como deixar uma criança ir sozinha à padaria”.
Somos bons em reagir, mas não somos bons em antecipar. Aprendemos a fazer gestão do que já existe. Precisamos aprender a antecipar.
Com as mudanças mais aceleradas, motivadas pela rápida transformação tecnológica, o mundo tornou-se rapidamente mais complexo. E, em ambientes complexos, não existem soluções simples. “Ser complexo é estar conectado com mais coisas. Há uma horizontalidade no mundo digital, em que não se consegue mapear de onde vêm as coisas”. Ela cita como exemplo a pós-verdade. “As pessoas não pensam mais, elas acreditam e pronto”. Segundo a especialista, no tempo da verdade o silogismo era ‘penso, logo existo’. Em tempos de pós-verdade, o raciocínio passou a ser: acredito, logo estou certo. “As pessoas preferem mentiras confortáveis a verdades inconvenientes. Mas não podemos nos basear em achismos, mas em informações fundamentadas”.
A complexidade dos ambientes nessa 4ª Revolução Industrial é muito maior, por isso seus agentes também precisam ser mais sofisticados. Um atributo importante neste momento é o da colaboração. Em ambientes complexos, a colaboração é fundamental. “Eu não dou conta de tudo, mas posso me associar. O sucesso vem da colaboração e essas parcerias são fundamentais”, defende.
A tecnologia também trouxe a eliminação de algumas figuras até então presentes nas relações comerciais. O intermediário é uma delas. Ela cita como exemplo os aplicativos de táxi, que tornaram obsoletas as agências que reuniam taxistas. No ramo hoteleiro, aplicativos como o Booking também reduziram a participação das agências especializadas. Na educação, há uma grande mudança na função do professor. Ele existe para ajudar a pensar e não só para passar conteúdo, uma vez que este é facilmente encontrado na internet.
“Tudo o que está no intermediário tende a desaparecer. Só vai ficar intermediando quem tiver muito valor”, prevê a especialista. Usando como metáfora uma ampulheta, ela explica que a parte de cima desse objeto relacionado ao tempo está cada vez mais cheia de pessoas antenadas e empreendedoras e na base estão aqueles que fazem funções que os robôs não conseguem fazer. Essas funções estão relacionadas ao emocional e pessoal, uma vez que os robôs não realizam tarefas que demandem emoção, ética e empatia, sendo a primeira dessa lista a qualidade que mais diferencia humanos e robôs.
Citando frase do célebre escritor e especialista em inteligência artificial, Kevin Kelly, a palestrante lembrou que “máquinas são para respostas e humanos para perguntas.” Essa é a tarefa principal do ser humano hoje. Portanto, há uma questão importante que é ‘o que perguntar’. É isso que vai permitir ao humano não ter sua tarefa substituída por um robô.
Diferenciação competitiva
Em meio a todo esse cenário que remete os mais velhos aos filmes de ficção científica, Martha Gabriel lembrou aos presentes que a experiência do público é o novo campo de batalha da diferenciação competitiva. “Isso foi o que a Starbucks fez de forma muito bem-sucedida. Ofereceu uma outra experiência para o consumidor de café”. Há, nesse case, foco nas pessoas e não na tecnologia. Contudo, o foco foi dado a partir das grandes mudanças tecnológicas.