ABIC Entrevista: Gil Barabach, da consultoria Safras & Mercado

Em conversa exclusiva para o Jornal do Café, Analista fala sobre o cenário geral da produção cafeeira e as perspectivas para o setor

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Crédito: Unsplash
27/05/2022
Publicado em

Nos últimos anos, o mercado de café brasileiro tem encarado muitas dificuldades. Problemas relacionados à pandemia, somados às adversidades climáticas e questões econômicas e políticas, colocaram o setor em estado de atenção.

Para explicar o cenário atual e apontar possíveis caminhos para o segmento, o Jornal do Café convidou Gil Barabach, Analista do setor da consultoria Safras & Mercado, para uma conversa exclusiva.

Gil Barabach

Qual a previsão para a colheita desse ano? Está dentro do que se esperava para um período de bienalidade positiva?

A nossa previsão de safra é de 61 a 62 milhões de sacas, mas isso vai depender muito do conilon, que está com um cenário, inicialmente, bastante positivo. O arábica ainda está muito no início da colheita para construir previsões. Esse tamanho de safra está abaixo do potencial, apesar de estarmos um pouco mais otimistas por conta do conilon. Esse é um ano de carga alta na lavoura de arábica, então, a base de comparação é com um ano similar, que foi a safra recorde de 70 milhões, de 2020. Se pegarmos o patamar de hoje em relação a essa produção, e segmentar só pela questão do arábica, vemos que perdemos potencial por conta das questões climáticas enfrentadas pelo país nos últimos anos. Em 2020, a produção desse grão estava em 50 milhões de sacas. Esse ano, a expectativa é de 38 a 40 milhões. São 10 a 12 milhões de sacas que perdemos.

O quadro geral só não é pior devido ao crescimento do conilon de 2020 para cá. Isso é reflexo de investimentos feitos anos atrás, rejuvenescimento do parque e clima favorável. O fato é que perdemos potencial produtivo e, isso tem um impacto na  oferta, menor que o inicialmente, refletindo nos preços.

Quais as perspectivas para a comercialização desta safra?

Em termos de fluxo de venda, tivemos um período de aceleração e, agora, com a geada e o salto nos preços, vimos uma postura mais tranquila do produtor, principalmente, os de arábica frente às dúvidas em relação ao tamanho da safra. O mercado já precificou tanto a quebra de 2021, como a perda de potencial desse ano. Agora ele está procurando saber qual o tamanho real da safra 2022, se vai ficar dentro do esperado, ligeiramente abaixo ou acima, para fazer os ajustes necessários, mas já está tudo precificado, como citei anteriormente. Resumindo: no mercado internacional, o preço do café arábica, base Nova York, saiu de U$1 por libra/peso e bateu pico, em fevereiro, de U$2,60. Observamos um fluxo financeiro favorável, com maior liquidez no mundo e juros baixos, houve a escalada no preço das commodities, que contribuíram com essa alta nos preços. 

O mercado tá olhando para frente, está pensando no que vai acontecer em 2022, se vai confirmar o que estava esperando, e fará ajustes. Ao longo do segundo semestre, o olhar se volta para 2023, cuja expectativa é de crescimento na produção, principalmente, no Brasil. Quando olhamos para Nova York, vemos que o spread (diferença entre o preço de venda e o preço de compra de um ativo) está invertido por conta da expectativa de melhora na oferta. Tal cenário vai interferir nos preços ao longo desse ano, então, a ideia é que você tenha um preço base refletindo essa melhora, e o preço segmentado, espelhando a questão da disponibilidade desse café. 

Você pode ter um quadro internacional de preço em acomodação, e um interno com alguns segmentos mais valorizados por conta da disponibilidade. Não podemos esquecer que perdemos potencial de safra.

 [Guerra na Ucrânia: como ela impacta o café brasileiro?]

O que causou a oferta seletiva de grãos no ano passado? Quais os principais obstáculos para se conquistar uma oferta plena de café?

Basicamente o que vimos foi: menor oferta de arábica e maior oferta de conilon, pois tivemos uma safra maior deste último. Estamos em processo de crescimento desse tipo de grão no Brasil. Já o arábica foi afetado pelas questões climáticas. Era para termos uma safra maior, o que não aconteceu devido essas adversidades. 

De uma forma geral, o arábica teve uma valorização e o conilon subiu, apoiado nisso. O conilon, apesar de ter mais oferta e de ter um cenário internacional um pouco menos firme que o arábica, subiu internamente por conta da indústria de torrado e moído, que comprou bastante desse café, dando um suporte aos preços. Como o arábica estava muito caro, colocaram um pouco mais de conilon nos blends, para equacionar custos, pois estava difícil repassar o aumento para o consumidor final. Isso deu suporte ao preço desse grão, que mesmo subindo bastante, estava mais vantajoso do que o arábica.

O mercado de café está muito volátil? O que causa isso?

Há uma série de fatores que contribuem para essa volatilidade. Primeiro a pandemia, que jogou os preços para baixo e depois para cima,  vale tanto para as commodities de modo geral, quanto para o café em particular. A logística também foi um fator e, também, a mudança do comportamento financeiro. Tivemos um momento para combater a pandemia, de uma política monetária de juros baixos e muita liquidez no mercado, o que ajudou a causar a inflação que estamos encarando agora, o que inverte a questão: temos juros altos e pouca liquidez. Isso tudo traz volatilidade.

A guerra na Ucrânia é uma questão adicional, criando  mais incertezas. A China também, sendo um grande comprador de commodities, pois está desacelerando seu crescimento, afetando as moedas emergentes e os países que exportam commodities. O café, mesmo a China não sendo um grande comprador, acaba sendo afetado por essas questões também.

Quais as perspectivas para o resto do ano?

Vivemos um momento de mercado de clima, ele está bem agitado por conta das baixas temperaturas sofridas pelo Brasil e o risco de geadas, que poderiam quebrar as safras novamente. O foco é no curto prazo, no impacto que esses fatores climáticos podem gerar. 

Agora, dentro de um cenário em que a quebra não ocorra, e que a primavera seja normal em termos de chuva, uma melhora na produção começa a ser desenhada para o ano que vem, algo que começa a refletir nos preços já nesse segundo semestre. Olhando para a bolsa de Nova York, por exemplo, sendo a referência de preço do arábica, você começa a enxergar pontos para diminuir a inclinação positiva da curva, o que interfere nos preços ao longo do ano. 

Internamente, isso vai depender muito da disponibilidade, do perfil da colheita, se vai ser úmido ou não, a variedade de ofertas, tudo isso afeta nos preços. A questão do conilon é importante, pois tende a ser uma safra maior que o arábica, e isso deve manter uma relação de preços mais favorável ao conilon, principalmente, para a indústria de torrados e moídos, especialmente, nesse começo de safra. Todos esses fatores que interferem no comportamento da precificação.

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Redação: Usina da Comunicação

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